Prevenindo o câncer colorretal em todo o Brasil

Histórias

Grandes diferenças na incidência de casos entre as regiões Norte e Sul podem ser justificadas pela subnotificação. No barco-hospital Abaré, o cirurgião Marcelo Averbach realiza trabalho preventivo no Alto Amazonas.

O câncer colorretal ocupa o terceiro lugar entre os tumores malignos no Brasil. De acordo com o Instituto Nacional do Câncer (Inca), o câncer de cólon e reto em homens é o segundo mais incidente nas Regiões Sudeste (28,62/100 mil) e Centro-Oeste (15,40/100 mil). Na Região Sul (25,11/100 mil), é o terceiro tumor mais frequente e, nas Regiões Nordeste (8,91/100 mil) e Norte (5,43/100 mil), ocupa a quarta posição.

Para as mulheres, é o segundo mais frequente nas Regiões Sudeste (26,18/100 mil) e Sul (23,65/100 mil). Nas Regiões Centro-Oeste (15,24/100 mil), Nordeste (10,79/100 mil) e Norte (6,48/100 mil) é o terceiro mais incidente. Mas o que justifica uma incidência quase seis vezes maior no Sudeste do que no Norte? Em meio a rios, igarapés e a natureza exuberante da Amazônia, que já haviam encantado Henry Ford nos anos 1920, o médico paulistano Marcelo Averbach procurava entender a questão que o deixava intrigado.

Em parceria com a Boston Scientific e a prefeitura de Belterra, partiu no barco hospital Abaré e deu início ao projeto "Quem Procura, Cura". Ao conversar com um líder comunitário de Aramanaí, um distrito de Belterra, no Pará, encontrou a resposta: nós moramos no paraíso, só nos faltam cuidados de saúde.

O esforço conjunto do médico, do governo e da empresa trouxe o atendimento que as populações ribeirinhas à beira do Rio Tapajós precisavam. Com os investimentos em comunicação, o projeto conquistou um índice de aderência de 96%. "Foram mais de 4 mil exames e o que descobrimos foi um contexto de subnotificação. O estado do Pará tem a pior relação médico-paciente e a pior distribuição de médicos do País. O número de casos não é tão baixo quanto se imaginava. Por causa da falta de infraestrutura, esses pacientes não eram diagnosticados", explica.

Formado em medicina pela Universidade de São Paulo (USP) e membro do Corpo Docente da Residência Médica em Endoscopia do Hospital Sírio Libanês, Marcelo participou, entre 2014 e 2017, de 19 expedições. Além de levar atendimento médico a populações desassistidas e contribuir para o rastreamento do câncer colorretal, as ações tiveram um viés de ensino, com a presença de estudantes nas equipes e resultados publicados na revista Endoscopy. "O trabalho também foi premiado no Congresso Médico Universitário da USP e foi a base da minha tese de livre-docência", relembra.

Mais de uma década a serviço das populações desassistidas O projeto " Quem Procura, Cura" foi um marco nas atividades de voluntariado de Marcelo, embora não tenha sido sua primeira experiência em regiões remotas. 

Em 2009, junto ao colega Fábio Tozzi, embarcou pela primeira vez no Abaré. Em 2010, novamente no Amazonas, conheceu a aldeia indígena Zoé e, com uma pequena estrutura de hospital de campanha, que recebeu materiais e equipamentos para funcionar como centro cirúrgico, realizou cinco cirurgias de vesícula. Ao retornar, juntou-se aos Expedicionários da Saúde em Campinas (SP) e passou a atuar em áreas indígenas, conhecendo os yanomamis que vivem próximos à Venezuela e os Tukanos, no alto do Rio Negro. A expedição durou até 2014, quando se uniu ao "Quem Procura, Cura''.

Os bons resultados acadêmicos e profissionais do projeto, somados ao sentimento gratificante de atender quem mais precisa, em regiões remotas do Brasil, trouxeram uma inquietação. Qual seria o próximo passo? As ideias foram amadurecendo e, ao lembrar da população isolada, com adornos nos lábios e um nome inspirador, o novo projeto foi batizado. Há dois anos, nascia a organização não-governamental (ONG) Zoé, que significa "nós mesmos" no ramo do tupi-guarani falado naquela região. 

Hoje com 12 voluntários, a ONG acabou envolvendo toda a família Averbach: a esposa Beatriz, dermatologista, estará na próxima expedição, assim como os dois filhos: Plínio, que é diretor-executivo da ONG, e Pedro, também cirurgião. No total, a equipe pretende realizar 10 expedições até o fim de 2022. "Para mim, é muito gratificante levar assistência a essa população e eu acabo contagiando as pessoas próximas. É uma roda viva e eu sempre quero fazer mais."

Preparando-se para a sexta jornada no Alto Amazonas, Marcelo reflete sobre como o estilo de vida urbano se propaga e contribui para o aumento dos casos na região, mas também como o acesso à informação pode ajudar a controlar a doença. "O câncer colorretal é uma soma de fatores genéticos e maus hábitos, como tabagismo, alcoolismo, consumo de embutidos e enlatados, além de fatores ambientais. Com a campanha, convencer a população de Belterra a realizar os exames não foi um problema.

A colonoscopia e a endoscopia são vistas com mais naturalidade hoje e, com o diagnóstico precoce, o prognóstico é cada vez melhor. A colostomia, por exemplo, tornou-se uma exceção e, quando necessária, costuma ser temporária. Nossos esforços, seja em São Paulo ou em Belterra, são para devolver esse paciente à vida normal", conclui.

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